“Seca relâmpago”: o que é e como identificá-la a partir de mapas?



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Esta semana, a Organização das Nações Unidos (ONU) divulgou o relatório Drought 2021, no qual alerta que a seca está prestes se tornar a próxima "pandemia".

Isso em função da possibilidade de os danos acumulados pela seca, em escala global, serem equivalentes ou mais graves do que a pandemia do coronavírus. A situação tende a se agravar, pela aceleração do processo da mudança climática e o aumento da temperatura do Planeta.

Em janeiro de 2019, um Relatório da comissão The Lancet já previa uma sindemia global de obesidade, desnutrição e mudança climática. Sindemia é um conceito cunhado nos anos 1990, que caracteriza a interação mutuamente agravante entre problemas de saúde, em populações que se tornam mais suscetíveis, em razão de seu contexto social e econômico.

Neste mês de junho, uma “seca relâmpago” atingiu o Nordeste brasileiro. As secas "relâmpagos” são secas que começam repentinamente e, em pouco tempo, tornam-se intensas.

No início de março de 2021, apesar de os solos estarem um pouco secos, as condições eram favoráveis, para seu Pedro Bento, um agricultor do Agreste da Paraíba, no Semiárido brasileiro. Aparentemente, a safra de milho e feijão, cultivada em forma de sequeiro, parecia promissora. 

Mas essa expectativa durou pouco. Depois de algumas semanas, no início de abril, os solos já estavam muito secos. Com a falta de chuvas, as safras de feijão e milho foram devastadas. O que ocorreu ali foi uma seca "relâmpago", que afetou grande da região. 

O que é a seca "relâmpago"?

Existem diferentes tipos de secas (hidrológica, agrícola, socioeconômica e meteorológica). De uma maneira geral, elas são caracterizadas quando a quantidade de chuvas é insuficiente.

Antes de falar do conceito da seca "relâmpago", vamos relembrar os outros tipos de secas. 

A seca é caracterizada pelos especialistas como uma falta ou déficit de umidade do solo disponível, para atender a várias necessidades, como na agricultura ou de recursos hídricos.

No Livro "Um século de secas", os autores classificaram diferentes tipos de secas, dependendo de onde há falta de água ou quais são seus efeitos:

- Seca meteorológica: quando a precipitação recebida está muito abaixo da quantidade normal esperada;

- Seca agrícola: quando não há umidade suficiente no solo para o desenvolvimento de uma cultura, em qualquer estágio de crescimento; 

- Seca hidrológica: é um déficit no fluxo dos rios, de modo que o escoamento não atende às necessidades de armazenamento na superfície, como barragens e reservatórios; 

- Seca socioeconômica: é a falta de água que afeta a oferta e a demanda de bens e serviços econômicos.

Diferentes tipos de seca podem ocorrer ao mesmo tempo, ou uma seca pode passar de um tipo para outro. As secas podem durar de meses a décadas, atingindo áreas que vão desde uma região local local até a maior parte do continente.

Por exemplo, no Livro "Um século de secas", foi analisada a maior seca do século, que durou cerca de sete anos, no Semiárido brasileiro (2010-2017). 

Recentemente, uma nova caracterização foi adicionada ao espectro da seca: a seca “relâmpago”. São eventos climáticos repentinos, que se intensificam rapidamente, em períodos de poucas semanas ou meses.

Além da baixíssima umidade do solo, há outros fatores que influenciam na seca "relâmpago": altas temperaturas, baixa umidade, alta pressão atmosférica, ventos fortes e céu limpo.

Os mapas abaixo mostram como uma seca relâmpago atingiu rapidamente o Nordeste brasileiro, desde as primeiras semanas de junho. Em pouco tempo, algumas áreas da região passaram de uma situação normal de seca a uma condição de seca severa ou extrema.

Foi o caso de estados como o Ceará, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas, Sergipe e nordeste da Bahia. As áreas em laranja, no mapa, indicam seca severa, enquanto as áreas em vermelho, destacam situação de seca extrema atualmente.

Esse tipo de evento climático, no qual condições mais secas do que o normal se transformam em seca severa ou extrema, no espaço de apenas algumas semanas, é chamado de “seca relâmpago”. As secas relâmpagos ainda não são bem compreendidas pela ciência.

Essas condições tornam o ar quente e seco, o que os meteorologistas chamam de “aumento da demanda evaporativa”. Isso significa que mais água evapora da superfície e transpira das plantas, e a umidade do solo se esgota rapidamente.

Nessas condições, a evaporação e a transpiração aumentam enquanto houver umidade disponível, na superfície. Quando essa umidade se esgota e não há chuva para reabastecê-la, a falta de água limita a evaporação e a transpiração. Desse modo, a vegetação fica estressada com o surgimento da seca.

Que imagens de satélites permitem identificar a seca "relâmpago"?

A seca relâmpago pode ser identificada rapidamente, a partir de imagens de satélites. É o caso dos mapas do Índice de Precipitação Padronizado (SPI), baseados em dados CHIRPS de precipitação, obtidos a partir de satélites. Os mapas acima, referentes ao SPI do mês de junho, são exemplos de monitoramento desse tipo de seca. 

No vídeo abaixo, o meteorologista e geoprocessador Humberto Barbosa, fundador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), explica mais detalhes sobre o fenômeno.

Durante a Live “Geoprocessamento para redução do risco de seca na agricultura”, ele destacou quais são os principais mapas ou produtos agrometeorológicos, utilizados para monitorar a seca relâmpago, além de outros tipos de secas.

Por que não ouvimos falar antes sobre a secas "relâmpagos"?

As secas "relâmpagos" sempre existiram. O conceito foi criado, em 2002, pelo climatologista Mark Svoboda, do National Drought Mitigation Center (NDMC), dos Estados Unidos. No entanto, algumas secas relâmpagos particularmente devastadoras, na última década, levaram ao aumento do interesse entre os pesquisadores.

No Brasil, os autores do Livro "Um século de secas" também identificaram, como uma "seca relâmpago", em 2011, deu início ao ciclo da seca mais longa, já registrada na história do Semiárido brasileiro. O estudo foi baseado em séries temporais de dados de satélites.

As secas "relâmpagos" também têm recebido uma crescente atenção na China e na Austrália. Um dos poucos estudos de seca repentina, na Austrália, examinou um evento climático, quando as condições no leste do país mudaram repentinamente, passando de úmido, em dezembro de 2017, para seco, em janeiro de 2018.

O meteorologista Humberto Barbosa, fundador do Laboratório Lapis, explica que, no Semiárido brasileiro, secas "relâmpagos" ocorrem em todas as estações. Na região, as secas relâmpagos são mais frequentes no verão e no outono. Elas podem terminar tão rapidamente quanto começam, mas em alguns casos, costumam durar muitos meses.

Em vários casos, secas relâmpagos, no Semiárido brasileiro, começaram no verão ou no outono, e a região permaneceu seca durante o inverno seguinte, bem como na primavera. Dessa forma, a seca relâmpago pode ser o catalisador para as secas comuns, que duram de 6 a 12 meses, típicas do Semiárido brasileiro.

"Há muito tempo, sabemos que as secas, em escala sazonal, no Nordeste brasileiro, estão fortemente relacionadas ao El Niño Oscilação Sul (ENSO), o que nos dá alguma capacidade de prevê-las", explica Humberto. 

O ENSO afeta fortemente as chuvas, o que significa que também pode estar relacionado a secas "relâmpagos", no verão e no outono.

"A previsão sub-sazonal, que prevê as condições climáticas, com períodos de semanas ou até de um mês de antecedência, melhorou consideravelmente, nos últimos anos. Considerando que as secas 'relâmpagos' ocorrem nessas escalas de tempo, podemos estar otimistas de que sua previsão pode ser possível", completa o meteorologista.

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Mais informações

O conteúdo sobre os vários tipos de secas e como monitorá-las, com uso de imagens de satélites, foi aprofundado no Livro “Um século de secas”.

Leia aqui o Relatório da ONU Drought 2021

E você, está preparado para monitorar a seca e minimizar os seus riscos em setores econômicos, como a agricultura? Já conhece as ferramentas de geoprocessamento disponíveis para a identificação do início, intensidade e extensão de uma seca?

COMO CITAR ESTE ARTIGO:

LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].

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